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terça-feira, 30 de agosto de 2011

POESIA DO IVAN

IVAN escreve, tentando retratar a época em que viveu, sonhou, sofreu. Quantas vezes conversamos sobre seus sonhos.

Essa não
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NAMUNCURÁ, O NETO DO CACIQUE ARAUCÂNIO CALFUCURÁ

BALDE DE ÀGUA FRIA NA INDÚSTRIA ESPACIAL


Beatificação de Severino Namuncurá

O vídeo em espanhol mostra, além da beatificação do santo índio, os pagos onde ele nasceu.

SALESIANOS E FILHAS DE MARIA AUXILIADORA (SALESIANAS)

PRESENÇA DOS SALESIANOS E FILHAS DE MARIA AUXILIADORA NO MUNDO
                 Nações. Presenças. SDB
NazioniPresenzeSalesiani
America246234.099
Africa411801.333
Asia255003.866
Europa337067.110
Oceania526160
totale1282.03616.568
FIGLIE DI MARIA AUSILIATRICE
NazioniPresenzeSalesiane
America235844.783
Africa2283490
Asia182672.291
Europa225667.268
Oceania41148
totale891.51114.880

sábado, 27 de agosto de 2011

A HISTÓRIA DE LAURA VICUÑA, JOVEM ALUNA SALESIANA (FMA).


Laura del Carmen Vicuña (Laurita)

Fugitivos políticos

Laura nasceu em Santiago do Chile em 5 de abril de 1891. Faleceu em Junin de los Andes (Argentina) em 22 de janeiro de 1904. Filha de José Domingos Vicuña e Mercês Pinho. Os Vicuña pertenciam a uma das mais nobres famílias da aristocracia chilena, oriunda na antiga nobreza do reino dos Cavalheiros bascos de Navarra, Espanha. Em Santiago viviam justamente na paróquia conhecida como sendo dos «ricos e da aristocracia». Atualmente os Vicuña são ainda muito badalados no país.
A família chegou aos Andes na segunda metade do século XVIII, época da colonização espanhola. Um dos mais virtuosos e ativos bispos de Santiago em 1841, chamava-se Manoel Vicuña.
Segundo se afirma, o avô paterno Bernardino Vicuña, casando-se com uma plebéia, teria dado origem a um ramo inferior dos Vicuña. Por isso foi considerado degenerado e expulso do clan. O filho de Bernardino, José Domingos Vicuña, pai de Laura Vicuña, possivelmente com o fim de reconciliar-se e reentrar nas tradições nobre da família, entrou na carreira militar. Fato que nas jovens Repúblicas americanas, sem excetuar o Brasil, dava um status especial. O militar, o padre ou o político eram vistos como alguém que pertencia a um tipo de casta superior.
Em 1891 (41 anos após a Independência do país, 1850), houve no Chile uma violenta revolução civil na qual 20.000 pessoas perderam a vida. O presidente José Emanoel Balmaceda, reformador e progressista, o maior estadista chileno do seu tempo, apoiado pelo exército, teve contra si a Marinha e o Congresso, este dominado por fazendeiros reacionários. Quando os revolucionários entraram vitoriosos em Santiago, os defensores da legalidade, entre os quais os Vicuña, foram mortos, presos ou tiveram que fugir para o exílio, mesmo em se tratando de um militar de carreira como era o caso do genitor de Laura.
Domingos Vicuña achou o fato o cúmulo do infortúnio para um homem e para um cidadão. Primeiro tinha sido execrado pela família por ser filho de uma mãe que vinha da plebe. Agora, escorraçado pela pátria a quem havia servido corajosa e lealmente. A hostilidade do novo governo de Santiago era forte contra os Vicuña e eles não tinham mais nada a esperar. Obrigado a fugir, refugiando-se aqui e ali, estabelece-se em Temuco, 500 km ao Sul da capital, onde pensava iniciar nova vida.
Laurita esta com 18 meses. As longas viagens pelos vales e montanhas andinos, as necessidades e o frio austral abateram-se sobre a saúde da menina. Desde então, afirma Da. Mercês, a criança começou a apresentar um aspecto plácido e tranquilo.
Em 22 de maio de 1894, nasce uma irmãzinha, Júlia Amanda, ou Amandinha.
No entanto, o esposo de Mercês, não estava bem. Os contratempos, as angústias provocados pelos acontecimentos da pátria terminam por abater o ânimo do bravo oficial. Pouco depois do nascimento de Ana, um mal súbito tira-lhe a vida, deixando mãe e as duas crianças numa grave situação de abandono.
Viúva jovem e bela, a êxule chilena passou a ser duramente martirizada pelo luto, a solidão o desconforto e a responsabilidade pela educação das crianças. Reunindo todas as suas energias físicas e morais, lutou arduamente para não sucumbir, diante das tormentas que lhe atingiam como a fúria gélida e inclemente dos ventos patagônicos. Para sustentar as meninas trabalhava como costureira e abriu um pequeno negócio onde vendia algumas quinquilharias.

 Transferência para a Argentina

Em 1898 passa por Temuco o famoso missionário salesiano Pe. Domingos Milanésio (1843 – 1922). Voltava de Santiago com três missionárias,[71] destinadas a Junin de los Andes, Argentina. A partida do Pe. Milanésio, aumenta o desejo que Mercês já vinha acalentando de se transferir para a Argentina. A vida em sua terra tornava-se sempre mais difícil. Agravara-se após um furto realizado em seu negócio. Pensa-se que outro motivo que a impelia a deixar Temuco era o contínuo assédio que sofria. Tinha então 30 anos. Mercês viaja em fevereiro ou março de 1899.
Durante os meses do verão austral, dezembro a março, eram constantes as caravanas de chilenos que se dirigiam ao país vizinho. Comerciantes subiam e desciam os Andes vendendo seus vinhos, tecidos e outros produtos. Retornavam ao Chile carregados de peles ou comboiando rebanhos de quadrúpedes.
Em Neuquen, vizinha Província argentina, surgiam então os primeiros centros populacionais, as fazendas de criação ou estabelecimentos agrícolas.

 Ñorquin, o segundo exílio

O novo local de exílio pareceu imediatamente pior que o anterior. Em Ñorquin vivia em torno de um quartel de fronteira, uma população adventícia, formada por chilenos, argentinos, índios araucânios e aventureiros europeus de vários países.
A vida religiosa era uma lástima. Os relatórios dos missionários dizem que se não fosse a presença de algumas senhoras e moças, educadas cristãmente em Colégios chilenos e que eram como faróis em meio a tanta escuridão moral, o vilarejo não seria mais que um «um lugar de perversão».
A viúva não encontra trabalho e se preocupa sempre mais com a educação da filha mais velha que já está com 8 anos. Sentia terrivelmente a amargura e a solidão de se encontrar numa terra estranha e provocante. Em poucas semanas reinicia nova peregrinação.

 Las Lajas

Tratava-se de um lugarejo não muito melhor que Ñorquin. Ali viviam numa estranha mistura de «todas as raças de indígenas e civís de todas as religiões. Faltava somente a religião católica, vivida e praticada».[72] Vez por outra aparecia um missionário.
Passam os dias e nenhum sinal de emprego. Cerca de dois meses são suficientes para que Mercês Pinho se convencesse da necessidade de novo êxodo. Outra sua conclusão era que uma vida errante e desprovida de meios não lhe daria condições de dar educação às filhas. A ilusão de ter emigrado, pensando em melhores dias, fazia sofrer seu coração de mãe. Os autores lidos não nos esclarecem muito sobre seu espírito de fé, que como veremos, mudou após a morte de Laura.

 Junin de los Andes

No final de 1899, mãe e filhas encontram-se em Junin de los Andes. O povoado surgira em 1879, em torno a um quartel, após uma sanguinolenta campanha do exército argentino contra os índios araucânios. Situava-se a 780m acima do nível do mar, tendo na época cerca de 300 hab.

 Colégio das FMA (Salesianas)

Construído com muita dificuldade pelo Pe. D. Milanésio, foi inaugurado em 6 de março de 1899. Começou com 19 alunas, 10 internas e 9 externas.
A pobreza era extrema, o baú que as irmãs haviam trazido de Santiago servia como sofá. Havia uma só mesa que viajava de lá para cá, transportada pelas meninas. O alimento era à base de carne e feijão, faltavam batatas e verduras, mais tarde providenciadas pela horta do Pe. Milanésio. As ervas silvestres serviam como acompanhamento.
A roupa era lavada no rio Chimehuin, vizinho a ambos os Colégios dos SDB e das FMA.

 Exílio de fronteira

Tudo era distante de qualquer centro urbano argentino ou chileno. Por 10 anos nenhuma Inspetora se aventurou naquelas paragens. As irmãs de Junin não tinham condições de visitar outras comunidades. Para se chegar a B. Aires ou Viedma, ambas na Argentina, tomava-se o trem em Santiago, capital do Chile. Dali se retornava atravessando os Andes. Junin «era um exílio de fronteira», afirmou a diretora que substituiu irmã Piai.
Naquele ano de ’89, o inverno na Patagônia Setentrional e na região de Neuquen foi terrífico e destruidor. O missionário salesiano, Dom João Cagliero relata: «Jamais se viu por aqui um cataclismo tão medonho e geral».[73] Chuvas diluviais, nevadas, rios desenfreados, invadindo campos e cidades. Parecia o fim do mundo.
Não se sabe claramente o que aconteceu com as três chilenas naqueles dias de dilúvio universal. O fato é que, possivelmente nos últimos meses de ’89 a jovem viúva passou a conviver com o fazendeiro argentino Manoel Mora.

 O falcão e a lebre

Muito embora indirectamente,  não podemos subestimar a influência de Manoel Mora na vida de Laura adolescente. Façamos sucintamente um perfil de sua personalidade.
Nascido possivelmente em Bahia Blanca, em 1860, originário de uma rica família da Província de Buenos Aires, começou a viver na Província de Neuquen, após o massacre dos araucânios, cujo chefe era o Cacique Namuncurá.
Nos finais da década de 1880, os tribos araucânias puseram Neuquem e arredores em polvorosa. No ano seguinte, o governo de B. Aires, cansado das rapinagens e reclamação dos habitantes resolveu mandar uma parte do exército para pacificar aqueles confins. Em dois anos, os aborígenes estavam mortos, prisioneiros ou escondidos nas montanhas andinas. A situação estava controlada, acontecendo por vezes apenas algum episódio de guerrilha.
Manoel Mora recebeu de B. Aires uma grande e ubertosa área no rio Quilquihué, a cerca de 20 km de Junin de los Andes. Arrendou-a começando duas fazendas para criação de bovinos: Quilquihué[74] (ou Chapelco) e Las Mercês. Com os irmãos Ângelo e Lourenço, «caballeros muy distintos de Manoel»,[75] tornou-se o fazendeiro[76] mais rico e famoso daquelas brenhas.
As testemunhas do processo da santa chileno-argentina falam bem dos irmãos e dizem barbaridades de M. Mora. Para os depoentes, o estancieiro portenho era o protótipo do gauchão arrogante, fanfarão, provocador, um tanto romântico e sonhador. Feito a machado e inculto, no entanto trajava-se refinadamente, seguindo a moda dos ricos criadores do campo. Sua majestosa cavalgadura de raça trazia os mais requintados arreios, dizendo do bom gosto e posses do vaqueiro que a cavalgava. Mora logo se sobressaia no meio de seus pares.
Gentilezas e cavalheirismos não lhes eram desconhecidos. No entanto, o coronel feudal, patrão de vários subordinados, tornava-se soberbo e violento com quem ousasse contradizê-lo. Disso foi prova uma de suas amantes, Tomasa Catalá, marcada por ele com o ferro dos animais da fazenda Chapelco. O Mora «era um homem que podia fascinar e aterrorizar, aparecer como âncora de salvação e transformar-se em cruel déspota».[77]
Vejamos alguns juízos exarados a seu respeito no processo de Laura:
- «Sujeito mal».
- «Gaucho mal».
- «Um homem que por nada empunhava a adaga e o revolver».
- «Indivíduo perverso, prepotente e vulgar»(Leonardo Cifuentes).
- «Um demônio»(Urrutia Lopez).
- «Rico proprietário de gado, de pouca instrução e sem religião»(as freiras de Junin)
Dona M. Vicuña e suas meninas foram cair justamente nas garras de uma ave de rapina. O que seria uma tábua de salvação tornou-se sem mais uma tirania.
Desconhecemos as circunstâncias em que Mora e Mercês se conheceram. O senhor Urrutia Lopez, octogenário, sustenta que o fato teria acontecido numa ocasião, em que o fazendeiro saíra do cárcere de Chos-Malal, onde tinha passado um certo tempo recluso. Dado seu espírito briguento, não era a primeira, nem seria a última vez que seria agarrado pela polícia.
Passando por Las Tajas, entre outubro de dezembro de 1899, M. Mora teria encontrado a viúva em dificuldades, levando-a para trabalhar em sua fazenda em Quilquihué. A afirmação é reforçada pelo Pe. Augusto Crestanello[78] em 1910, época em que ainda não se poderia falar de certos acontecimentos ainda bastante recentes. Na época Laura «tinha cerca de 9 anos, quando de Las Lajas passou a viver nas vizinhanças de Junin de los Andes»[79], na fazenda Quilquihué ou Chapelco.
Certamente a mãe de Laura entregara-se a um homem que não conhecia, impelida pelo fato de viver em um dos momentos mais difíceis de sua vida. Esperava posteriormente regularizar a situação religioso civil de seu estado. Na solidão em que se encontrava sonhou com a possibilidade de recomeçar um novo lar, juntamente com aquele fazendeiro oriundo da Província de B. Aires.
Pe. Zacarias Genghini[80] escreve:

«A senhora Pinho, encontando-se só, sem recursos e com duas filhas para manter, aceitou conviver com Manoel Mora, como fazem em idênticas situações muitas senhoras, segundo o uso deplorável destas terras».[81]

Acreditamos que face ao problema e à situação social, não se pode, à primeira vista, condenar sumariamente a mãe de Laura e Júlia Amanda. Na época em todo o pampa argentino, como em diversos outros países e Continentes encontravam-se casais convivendo no mesmo teto em situações irregulares perante o Estado e a Igreja. O mesmo Pe. Z. Genghini, conhecedor da região de Neuquen e arredores, escrevia que o fenômeno acontecia com 65% da população de Neuquen. Se o caso de Da. Mercês chamou a atenção – é ainda o missionário que fala – deve-se ao fato da truculência, do poder e riqueza do fazendeiro Mora.
Madre Piai, superiora da comunidade salesiana de Junin de los Andes, referindo-se a um caso semelhante ao de Mercês deixou escrito: «Todo mundo em Junin conhecia o fato e ninguém estranhava, pois se tratava de um costume inveterado no lugar». Assim decorriam os meses sem que se modificasse a situação do casal, pois o estancieiro não pensava em instituir uma família regularmente constituída.

 Oferta da vida pela conversão da mãe

Laura não demorou a perceber a situação irregular do casal. Sofria muito e rezava constantemente para que houvesse uma normalização. A maior amargura era ver a mãe longe dos Sacramentos, sobretudo nos momentos solenes como foi o de sua Primeira Comunhão. À medida que crescia aumentavam-lhe as agruras secretas de seu coração e as penitências e preces pela conversão da mãe.

Internato das Filhas de Maria Auxiliadora em Junin de los Andes

Laura del Carmine Vicuña, nove anos e Amanda Vicuña, seis entram no Colégio das FMA em 21 de janeiro de 1900. Cada uma pagaria 15 pesos mensais. Da. Mercês ao apresentar a filha mais velha à diretora dizia: «Jamais me causa desgosto. Desde a infância sempre foi obediente e submissa».
No final do ano foram passar as férias em Quilquihué. Laura preferia ficar com as irmãs em Junin. Embora adorasse a mãe, não se sentia bem na fazenda de Mora. Quando retornou ao Colégio voltou ao seu paraíso.
Sua felicidade no entanto, não impediu que as mestras percebessem em seu comportamento uma tristeza angustiante. Lia-se em seu olhar profundo o pensamento fixo na mãe. Aquela criança estudiosa e em tudo exemplar, guardava silenciosamente uma dor que lhe torturava o coração e martirizava a alma.
Estava com 10 anos. As irmãs sabiam que um de seus maiores desejos era fazer a 1a. Comunhão. Não estava ainda na idade, mas tinha todas as demais condições para fazê-lo. Desde que entrara no Colégio se preparava, estudando o Catecismo e refletindo sobre o grande dia. Quando a irmã diretora comunicou a decisão, Laura ficou tão surpresa e alegre que não conseguiu dizer nada. Apenas chorou. Ao lhe perguntarem porque chorava, respondeu balbuciando: penso na minha pobre mãe.
Constantemente chamava Júlia e se dirigiam à capela para rezarem por Da. Mercês. Logo que soube de sua admissão á 1a. Eucaristia seu esforço de preparação redobrou, no sentido da prática heróica de todas as virtudes. Propusera copiar em sua vida o mesmo que Domingos Sávio vivera no Oratório. Quando Amandinha lhe advertia que não precisava confessar-se tão frequentemente, respondia:

«quando estiveres para fazer a 1a. Comunhão verás como se deseja ser cândida e pura. Depois da confissão sinto-me mais forte contra as tentações e tudo me parece mais fácil».[82]

Alegrias e sofrimentos

A mãe das meninas não deixava passar muito tempo sem visitar as filhas, mesmo porque tinha que pagar as mensalidades. A visita era um momento feliz para todas. Laura no entanto, também sofria. Notava que sua mãe não era a mesma dos tempos de Temuco, Ñorquin ou Las Lajas. Parecia distante, sofredora. Não se entusiasmava pela Igreja e pela oração. Havia algo em sua vida, que a filha não entendia. Porque durante os dias de férias na fazenda, Da. Mercês não queria que ela rezasse diante do M. Mora? Porque ela mesma, sempre procurava um pretexto para não rezarem juntas? Esperava pelo menos que no dia de sua comunhão a mãe também se aproximasse do Sacramento da Eucaristia. No entanto, aquela alegria também lhe foi negada.
No terceiro propósito feito quando da primeira Comunhão, ofereceu a vida a Deus para reparar as ofensas dos homens, especialmente de sua família, leia-se sua mãe. Naquele dia pediu a Deus uma vida de amor, de mortificação e sacrifício.[83]
Pe. A. Crestanello afirmou que, se antes da primeira Comunhão Laura era obediente, humilde e afável, após o dois de junho, notou-se na menina um «verdadeiro e sólido progresso». Inspirando-se em S. Domingos Sávio, a beata vivia no Colégio de Junin de los Andes, o que o aluno de D. Bosco vivera em Valdocco. Nada de extraordinário. Procurava cumprir diariamente, de modo perfeito, os deveres de cada dia. Dom Bosco havia dito que era fácil ser santo. D. Sávio tinha conseguido em pouco tempo. A primogênita de Domingos Vicuña desejava e faria o mesmo.
Em Junin lia-se a vida de Sávio no refeitório e enquanto as meninas costuravam e engomavam. Os SDB e FMA falavam dele como se fosse uma glória doméstica. Laura se entusiasmou por ele e propôs imitar-lhe as virtudes até à perfeição. «Quero ser santa como ele». Um dia respondeu a Mercedinha[84] que tinha escolhido Sávio como modelo por causa de sua simplicidade, seu amor a Jesus Sacramentado e a Nossa Senhora.

 Beterrabas

As duas amigas, Laura e Mercedinha detestavam beterrabas, uma das iguarias constantes na frugal mesa de Junin. Para que se acostumassem foi-lhes ordenado que durante três dias, os famigerados tubérculos fossem colocados na mesa. Sem que a assistente percebesse, as colegas quiseram esvaziar-lhes os pratos. Mercedinha olha titubeante para Laura que lhe diz: «não Mercedinha, façamos um esforço e obedeçamos. Jesus sofreu tanto por nós na cruz».
Era verdadeiramente obcecada pelo Senhor. Certa feita confessava a amiga que durante a noite, quando queria mandar-lhe um recado, bastava pedir que seu anjo da guarda a despertasse, coisa que acontecia naturalmente.

 Enurese

A constituição física da primogênita de Domingos Vicuña não era das mais robustas. Em Junin a temperatura normalmente alcançava mais de 6 graus negativos. Laura era uma das que mais sofria naquelas ocasiões. A enurese[85] involuntária que se repetia insistente na época dos invernos glaciais, como foram os de 1900 e 1901, humilhava-a profundamente. A aluna vice assistente do dormitório na hora que as internas despertavam (no momento as irmãs se encontravam possivelmente na meditação), infligiu-lhe repetidamente um castigo (o biógrafo não diz qual), humilhando-a diante das colegas. Laura não se opôs à injusta punição. Tampouco abria a boca quando alguma colega achava que era incúria, preguiça ou indolência de se levantar a tempo. A diretora ao saber do acontecido não permitiu que a menina continuasse punida, nem que fosse alterada a ótima nota semanal de sua conduta.
Após uma daquelas punições, Laura descobriu Mercedinha chorando. Ao perguntar o que acontecera, se ela havia dado algum desprazer ao Senhor, a amiga respondeu que chorava por causa do que lhe haviam feito injustamente. A resposta que obteve é que aquilo não era nada, que ela esquecesse.
- Não tinham vestido o Senhor como um louco? Por que não devemos aceitar uma pequena humilhação nós que somos tão pecadoras?
No entanto, a filha maior de Da. Mercês era sensibilíssima. Às vezes lia-se em seu rosto o esforço que fazia para calar-se e humilhar-se. Não esqueçamos que Laura descendia de uma nobre família, onde corria nas veias «la sangre caliente de España» e que seu pai tinha sido um dos importantes oficiais do exército chileno.

 Banhos gelados

A fortaleza de ânimo de Laurita era contrastada pela debilidade física. Alguém certo dia levou à diretora uma sugestão peregrina: para fortalecer o organismo, Laura deveria submeter-se à cura dos banhos gelados.
A heróica menina – é a mesma irmã Piai quem o diz – obedecia como um cordeirinho. Quando mergulhava na água gelada, batiam-lhe os dentes e tremia-lhe todo o corpo. Jamais se lamentou, mesmo quando era convidada a repetir o mergulho e os campos ao redor do Colégio se encontravam cobertos por um lençol branco de neve. Que barbaridade!
Finalmente concluiu-se que o suplício não estava adiantando nada, apenas martirizava a pré adolescente. Quem sabe se seu estado de saúde não se agravou por causa daqueles malucos e absurdos banhos?
A irmã enfermeira por mais de uma vez transportou-a desmaiada em seus braços. Para se chegar ao dormitório devia-se atravessar o pátio, onde rugia o vento gélido que descia furioso dos Andes. A irmã Piai se admirava como Laura não morrera congelada.

A bela e a fera

Manoel Mora não pretendia casar com Mercês Pinho. Seus olhares e preferências voltavam-se para a filha. Pagava a escola preparando-a para depois casar-se com ela.
Aos 11 anos Laura era uma graciosa e atraente menina-moça. No ano de 1902, quando passava as férias na estância de Quilquihué, a jovem evitava a presença do Mora, pois percebera suas intenções a seu respeito.
Certo dia o fazendeiro, afastando Da. Mercês de casa, tentou aproximar-se da jovem, sendo energicamente rejeitado. A mãe desconfiada escondera-se e de uma janela presenciou angustiada as investidas da astuta raposa.
O furioso garanhão não desistiu. Durante um baile noturno, no momento de uma festa de ferra de animais, convidou Laura para dançar. Ao receber outra inesperada e drástica negativa, O Mora montou em fúrias, ordenando que a mãe fizesse com que a filha obedecesse. Como a Da. Mercês não conseguisse, foi espancada, amarrada num mourão onde se prendiam os cavalos e ameaçada a ser marcada com o ferro com que eram ferrados os bichos da fazenda.
Aquela noite permaneceu terrível e tragicamente inesquecível na memória de Laura. A menina tudo observara do lado de fora da casa, onde ao relento e ao frio a tinha jogado o embriagado e furibundo vaqueiro. A partir daquela ocasião, a primogênita de Domingos Vicuña começou a usar o cilício,[86] confessa à sua amiga Mercês Vera. E o fazia, com as demais mortificações, em «reparação a certos bailes que aconteciam em sua casa».
O abismo entre a bela e a fera tornava-se cada vez mais profundo e intransponível. Por outro lado, podemos supor os constantes problemas vividos entre sua mãe e o patrão. Sabe-se que Da. Mercês por diversas vezes teve que defender as meninas. Um dia gritou-lhe: «são minhas [filhas] e eu não estou aqui como uma escrava». Ao que o Mora teria respondido:
- Escrava ou morta. Quanto àquelas duas, veremos.
A astuta raposa não perdia a esperança de subjugar a presa. Um de seus estratagemas foi suspender o pagamento das mensalidades de ambas as meninas, obrigando mãe e filhas a trabalhar como empregadas na fazenda. A diretora do Colégio, ao saber do fato, concedeu uma bolsa de estudos a Laura, acertando com Da. Mercês que a aluna permaneceria no estabelecimento por cinco anos. É possível que Madre Piai tivesse determinado aquele tempo, pensando que seria um prazo suficiente para que Laura pudesse se tornar religiosa.

 Últimas férias em Quilquihué

As férias de 1902 foram as mais terríveis. Laura descobrira quão miseravelmente vivia sua mãe, física e moralmente. Longe de Deus não poderia ser feliz. Seu coração de filha sofria terrivelmente. Que fazer?
A festa do Bom Pastor trouxe-lhe uma idéia. Pensando na parábola evangélica, a jovem e martirizada filha concluiu que também ela, como o Bom Pastor, poderia oferecer a vida pela conversão e salvação da mãe. Tudo indica que seu projeto foi apresentado antes à religiosa e amiga Rosa Azóca. Esta aconselhou-a a apresentá-lo ao Confessor, Pe. A. Crestanello, seu futuro biógrafo e à diretora Madre Piai.
Um dos grandes desejos da aluna das Filhas de Maria Auxiliadora era ser também religiosa. Infelizmente, soube que não poderia, dadas as condições nas quais vivia sua mãe. Foi mais uma humilhação e um de seus maiores sofrimentos, afirma Pe. Crestanello. Ela no entanto aceitou o veredicto, aproveitando o fato para um maior exercício de ascese e maiores sacrifícios em vista da conversão da mãe.

Heroísmo na simplicidade

Laura cultivou uma piedade simples, sincera, alegre e sem afetação, fruto da educação salesiana ministrada no Colégio de Junin. Algumas de suas penitências são no entanto, superiores à sua idade e constituição física e para os nossos tempos um tanto exageradas.
Após oferecer a vida pela mudança espiritual da mãe, servia-se de todos os acontecimentos para sacrificar-se naquela intenção. Os biógrafos nos oferecem alguns exemplos dos sacrifícios enfrentados pela heróica filha dos Andes chilenos:
· durante a época de calor tomava água o menos possível;
· oferecia-se para executar os serviços mais humildes;
· nos tempos do frio patagônico, quase siberiano, prestava-se para varrer o pórtico, embora suas mãos sangrassem frequentemente por causa dos horríveis «sabañones» nos dedos;
· nas aulas ou no estudo de corte e costura procurava as posições mais incômodas, ficando praticamente imóvel;
· usava de grande simplicidade nas roupas e perfumes;
· procurava se alimentar das comidas mais insípidas, deixando as mais saborosas para as colegas;
· foi vista colocar cinza e sal na sopa;
· o caso das beterrabas, visto anteriormente;
· frequentemente usava pedrinhas nos sapatos;
· pedaços de madeira no colchão e travesseiro;
· por vezes ajoelhava-se no pórtico diante da diretora ou das colegas pedindo perdão por pequenas faltas que cometera;
· de índole facilmente irritável, explosiva, notava-se o esforço que fazia para conter-se em certas ocasiões;
· não falava de si, não se desculpava e odiava a mentira;
· enrubescia quando recebia elogios, dizendo que só havia feito o próprio dever;
· a enurese, um dos problemas que mais pode humilhar um interno ou interna, diante dos colegas
· durante as prédicas, para não dormir costumava lacerar os braços com pontas de alfinetes;
· uso do cilício com pontas metálicas.
· não se lamentava quando submetida aos banhos gelados.

Hoje para nós, como já acenamos, esta ascética austera e violenta parece superada. No entanto, há poucos anos de nós, um santo franciscano estigmatizado, Pe. Pio de Pietrelcina[87], usava-o em sua cidade de San Giovanni Rotondo, às margens do Adriático.

 Bondade e obediência

Ao observarmos superficialmente a Filha de Maria, Laura Vicuña, diremos que ela era tão somente uma boa aluna, obediente, cumpridora de seus deveres normais. Na realidade porém, seu dia a dia era admirável e ela fazia do quotidiano algo de extraordinário, como afirmou Pio XI. O viver cotidiano, a sucessão dos dias pode ser terrível. E mais ainda o será para um adolescente não afeito a uma existência metódica e disciplinada.
Bento XV, dirá em 1920, referindo-se a Laura: «a santidade consiste propriamente só na conformidade com a vontade divina, expressa em um contínuo e exato cumprimento dos deveres do próprio estado».

 Último ano escolar, 1903

Em fins de 1902 notou-se uma ligeira debilidade em seu estado físico. Bastante crescida Laura não mais aparentava uma adolescente, mas uma jovem em pleno desenvolvimento orgânico. Havia algo porém que lhe preocupava e ela considerava com muito mais seriedade que sua fraqueza física. A condição moral e o estado de quase escravidão de sua mãe a horrorizava. Seu pensamento, seu afeto de filha estavam sempre em Quilquihué, embora a simples lembrança daquele local, lhe enchesse de pavor e tristeza. Rezava, chorava, penitenciava-se. Segundo seu Confessor, a partir do dia em que ofereceu a vida pela conversão da mãe, Laura percebeu que seria atendida. A começar daquele momento, metade de 1902, é ainda Pe. A. Crestanello quem afirma, começou a definhar fisicamente.

 Inundações de julho de 1903

O inverno[88] gelado, chuvoso e húmido voltou novamente. O rio Chuimehuín invadiu os campos e os dois Colégios dos SDB e das FMA. Em cinco minutos as águas subiram furiosas quase um metro dentro de casa. O pânico das internas foi enorme especialmente quando tudo ficou no escuro. Parecia um fim de mundo, dirá uma das irmãs.
Freiras e alunas tiveram que se abrigar por alguns dias na casa da madrinha de Laura, senhora Felicinda Lagos de Espinós. Repetiam-se as cenas acontecidas na inundação de 1899.

 Definhando a olhos vistos

O frio, a humidade e o lamaçal aliados às vicissitudes do momento influenciaram sinistramente na saúde da pré-adoslescente chilena. Rosto pálido e macilento, caminhava com dificuldade, acompanhada por uma constante tosse. Suas forças a abandonavam visivelmente. Um mal incurável, lento e progressivo a conduzia ao fim. No entanto, convencida que Deus havia aceito sua oferta suportava tudo com edificante resignação.[89]
Naqueles tempos não havia propriamente médico em Junin. Apenas uma farmácia rudimentar. Talvez houvesse um em San Martin de los Andes, na guarnição militar, cerca de 20km em linha reta de Quilquihué. A alguém que a assistia (não é claro se um médico ou o farmacêutico, senhor Cordiel), Laura sussurrou: «em vão, doutor, o senhor aplica-me seus remédios para curar-me. Parece-me que se trata da última doença. Não ficarei mais boa».[90]
Todos se admiravam ao observá-la alegre e sorridente, lutando contra o grave mal. Jamais pedia algo para minorar os sofrimentos. Quando lhe perguntavam como estava, respondia sempre: «um pouco melhor». Todavia conversando com Pe. Crestanello confessava:

«sei que não estou doente por preguiça. Todavia, se penso nos sofrimentos de Cristo por mim, compreendo que sou bastante mesquinha ao sofrer de boa vontade estes meus pequenos achaques. Assistida como sou, temo que os cuidados dos outros terminem por habituar-me a comodidades excessivas».[91]

Certa feita concluía: «quem sabe, se o meu mal não é fraqueza de espírito»?
Embora pressentisse que estava próxima sua viagem ao Paraíso, não lhe atemorizava o medo da morte. Ao contrário, seu jovem coração sofredor sentia-se feliz por se encontrar a poucos passos do oásis definitivo.
A mãe na esperança que um repouso absoluto em Quilquihué lhe fizesse bem, levou-a àquela estância. Sobre este novo retorno à casa do Mora, Laura dirá que todos os seus incômodos somados, não lhe pesaram tanto, como aquela ausência de Junin, onde desejava passar seus últimos dias. E acrescentava: «Se Jesus quer também este meu sacrifício, seja feita sua amável vontade».
Partia para a fazenda aos 15 de setembro de 1903. Sofreria sem lamentos a falta da Missa e da Comunhão, a ausência e o conforto das colegas e das irmãs. Seu tormento era sobretudo pela presença do algoz de sua genitora, por observar a desventurada condição daquela por quem ela própria se imolava e desejava infinitamente vê-la convertida. É verdade que Mercês Pinho nos últimos dias havia pensado em fugir, como Laura já havia sugerido. Faltava-lhe porém a coragem. Para onde? E a filha Júlia Amanda, que crescia e vivia como uma indiazinha?
Quilquihué consumia ainda mais rapidamente as últimas resistências da heróica menina-moça. Não suportava observar a genitora sendo um joguete nas mãos do algoz que a escravizava. Por outro lado a mãe que assistia melancólica e paulatinamente o declinar da filha, nem sequer suspeitava, pelo menos na aparência, o motivo real daquele holocausto, guardado secretamente no coração de Laura, do confessor, de madre Piai e a irmã Azócar.
Já são quase dois meses que estão na fazenda e a enferma não melhora. Passa os dias e noites rezando e sofrendo, imolando-se conscientemente, sacrificando a própria vida pelo resgate de outra vida. Ninguém tem maior amor do que aquele que entrega sua vida pelo seu semelhante, dissera o Mestre galileu. E é maravilhoso, divino, oferecer a vida pela pessoa amada. Cada dia mais o Homem da Cruz a fazia compreender melhor aquela verdade.
Em Junin, no entanto havia melhores condições de assistência. Da. Mercês retoma o caminho de volta ao povoado. Passa a residir com as filhas, em uma casa alugada[92], nas imediações do Colégio das Irmãs.

 A ave de rapina ataca novamente

Em certas tardes via-se o Mora rondar pelos arredores do casebre, onde se encontravam mãe e filhas. Um dia, na primeira metade de janeiro de 1904, o coronel de Quilquihué adentra-se na tapera, resolvendo permanecer ali durante a noite. Da. Mercês se opôs, enquanto Laura, reunindo suas últimas forças, levanta-se do leito para dirigir-se ao Colégio das irmãs. Mora a agarrou e começou golpeá-la impiedosamente. Da. Felicinda Lagos encontrando-se presente, impediu que acontecesse males piores.
Daquela tarde em diante, abatida pelo acontecido e pelos maus tratos recebidos, a enferma não mais se reabilitou. No entanto, seus lábios continuavam sem nenhuma palavra de lamento.

A Patagônia se empobrece com o vôo de uma santa para o Céu

Em 21 de janeiro (1904), a enferma foi envolta por uma grande prostração. Febre alta e vômitos incessantes impediam-na de receber a Comunhão, fazendo pensar que morreria sem o Viático.[93]
Naquele dia, usando da maior lucidez, Laura chama a irmã Júlia Amanda, fazendo-lhe as últimas recomendações:

«Minha irmã, peço-te que uses de muita caridade e paciência para com a mamãe. Procura não dar-lhe desgosto e trata-a sempre com grande respeito. Sê humilde e obediente com ela e não a abandones nas suas necessidades...
Sê caridosa para com o próximo. Não desprezes os pobres, não olhes para ninguém com indiferença. Cara Júlia não esqueças estas recomendações de tua irmã, que está próxima a separar-se de ti! Voltaremos a nos reunir no Paraíso».[94]

O biógrafo Pe. Crestanello escreve que o diálogo não pode continuar, dada a emoção e o choro que envolvia a ambas.
Um dia após, a mártir recebeu o Viático. Está reduzida «a pele e osso, parecendo um esqueleto». As visitas não cessam, ela não se levanta, mas pode ainda balbuciar algumas palavras, aconselhando aos que a visitam.
Às 17h00 faz um aceno ao Pe. Z. Genghini, a fim de que ele se aproximasse de seu leito. Pede-lhe então que chame sua mãe no quarto ao lado. Da. Mercês, agitadíssima, pensando que eram os últimos instantes de Laura, precipita-se, gritando: «Filha, minha filha!...Deixas-me assim tão sozinha...»?
O momento que se seguiu deixou a todos transtornados e cada vez mais admirados pela grandeza e santidade de uma menina santa que estava prestes a deixar o tempo e entrar na eternidade.
Pe. Genghini se afasta discretamente, enquanto Mercedinha e Maria Vera como que petrificadas, junto à porta, ouviam pela primeira vez o segredo de Laura: a oferta de sua vida pela conversão da mãe.

«Laura superando a impressão que lhe causara a dor de sua mãe, com a voz entrecortada, mas cheia de amor e ternura, disse: "Sim mamãe, eu morro. Eu mesma pedi a Jesus. São quase dois anos que lhe ofereci minha vida pela senhora, para alcançar-lhe a graça de sua conversão. Ah, mamãe, não terei a alegria de vê-la arrependida"»?[95]

A declaração de Laura desencadeou um vulcão de emoções e lágrimas no coração e na alma da amargurada genitora chilena. De joelhos e abraçada à filha, respondeu soluçando convulsamente:

«Sou eu então, minha filha, a causa de teus longos sofrimentos e agora de tua morte. Oh, infeliz de mim! Minha cara Laura, neste momento, juro-te que farei quanto me pedes».[96]

Após rápidos instantes acrescenta: «Sim minha filha, amanhã irei com Amandinha, à Igreja para me confessar».
Uma infinita paz resplandecia do rosto de Laura, observaram os presentes. Nada mais lhe preocupava neste mundo. Havia comprido sua missão. A misericórdia divina, através dela havia triunfado no coração de Da. Vicuña. Beija constantemente o Crucifixo que apertava entre as mãos de uma lividez cadavérica. Enquanto a torturada Mercês soluçava sobre seu peito, a santinha dos pampas patagônicos exclamou: «obrigado Jesus, obrigado Maria! Agora morro feliz».
Foi sua última prece nesta terra. Júlia Cifuentes, então presente, diz que Laura morreu falando. Era o dia 22 de janeiro de 1904, sexta-feira. A jovem santa salesiana estava com 12 anos, nove meses e alguns dias.

Da. Mercês Vicuña e a filha Amandinha

Da. Mercês, após a morte da filha, ajudada por um casal amigo foge para o Chile, onde pretendia recomeçar a vida. No entanto, retorna a Junin para junto de Júlia Amanda, que se casa com apenas 12 anos.
Em 1911, ambas passam definitivamente à terra Natal. Mercês esposa um ferroviário de nome Parra. Seus últimos anos são vividos cristãmente nas vizinhanças de Temuco. Falece aos 17 de novembro de 1929 com 59 anos de idade. Amandinha toma conta do negócio que ela havia recomeçado.

O fim de Manoel Mora

O manda-chuva de Quilquihué continuou a perseguir Da. Mercês e ameaçá-la de morte, mesmo após a partida de Laura. Certa vez, portando um revolver, irrompeu no casebre onde ela passara a viver com a segunda filha. Nada aconteceu, pois para surpresa do casaca de couro, encontravam-se ali outras pessoas. Destilando ódio retirou-se, dizendo que só estaria tranquilo, após ver a mulher morta. O chefe de polícia de Junin teve que destacar um policial para proteger Da. Mercês. Alguns dia depois deste fato, Mora era preso pelo agente.
Entre 1906 e 1907, a viúva começou finalmente a viver tranquila. O estancieiro, em uma corrida de cavalos, inicia uma rixa, atingindo com uma rebengada um dos dois irmãos que se achavam presentes na festa. Na contenda Manoel Mora foi apunhalado e morto. Os dois fugiam para o Chile.

 Causa de beatificação de Laura del Carmen Vicuña

A notícia da morte de Laura espalhou-se às rápidas por Junin. Suas colegas colocaram-na a par com Domingos Sávio, chamando-a a santinha. Em poucos anos sua fama de santidade alcançou os Colégios argentinos e chilenos e a Casa Geral das Filhas de Maria Auxiliadora na Itália.
Em 1925 celebrou-se o cinquentenário das Missões salesianas da Patagônia, iniciadas pelo bispo Dom João Cagliero. Desencadeou-se na época (de ’25 a ’27) uma cascata de opúsculos biográficos, artigos e imagens exaltando a Serva de Deus. Rapidamente tornou-se com D. Sávio ideal e modelo de santidade juvenil.
As curas corporais e graças espirituais apareciam cada vez mais frequentes obtidas pela intercessão da santa dos Andes patagônicos. Em 1931 D. Rinaldi, terceiro sucessor de D. Bosco afirmava:

«Eu darei duas palmas a Laura, a palma da pureza e a do amor filial. Penso que logo (se conhecida) Laura Vicuña poderá ser uma das glórias mais belas da juventude, recolhida nas casas salesianas».[97]

Em 19 de setembro de 1955 na cidade argentina de Viedma foi introduzida sua causa de beatificação e canonização. Depuseram 19 testemunhas, entre as quais Júlia Amanda. O processo continuou com a intervenção de Cardeais, Arcebispos, bispos da Itália, Espanha e América.
O Papa João Paulo II beatificou-a em 3 de setembro de 1988, durante o «Confronto ’88». Diante de milhares de jóvens, reunidos na «Colina das beatitudes juvenis» (Colle don Bosco), o Santo Padre declarou-a modelo de coerência evangélica para os jovens de todo o mundo. Uma coerência que levou até às últimas consequências uma missão que era a de reintegrar a mãe nos caminhos do Senhor. Foi este um dos milagres, operados pela moça santiaguenha-patagônica.

[Na próxima postagem concluiremos a História dos três jovens santos salesianos, apresentando o argentino Severino Namuncurá].