CANÁ E O
VINHO NOVO
(Homilia do Pe. Antenor de Andrade na
festa de N. Sra. Auxiliadora. S. Nicolau, SP, 25/05/2012).
O Evangelho nos diz
que Jesus começou seus milagres em Caná
da Galiléia, manifestou sua glória e seus discípulos creram n`Ele
Em Caná temos
uma nova Epifania de Jesus: Ele já
havia se manifestado aos Magos e a João Batista no Jordão. Entre uma e outra
dessas manifestações, passaram-se trinta anos. Muitos o viram durante esse
tempo, mas Ele não se manifestou a todos, não se mostrou quem era realmente.
Nesta noite, gostaria
de refletir sobre o matrimônio de Cana sem abordar seus aspectos espirituais ou
místicos, com sejam o eucarístico e o batismal.
Jesus e sua Mãe
deviam ser parentes ou amigos íntimos da família. Não parece que Nsa. Senhora
fosse uma simples convidada, mas alguém que tinha ido para dar uma mãozinha,
para que as coisas saíssem bem. Fazia pouco tempo que Jesus tinha sido batizado
por João e como estivesse pregando naqueles entornos foi também convidado com os seus poucos discípulos.
Maria, a Mãe
que tudo vê, percebeu o problema e logo se dirige ao Filho dizendo: não tem mais vinho. Jesus resistiu um
pouco, mas operou o milagre,
transformando a água em vinho. Diz um poeta que a água, ao ver o seu Deus, mudou de cor, ficou vermelha. A presença
de Maria e de seu Filho fez com que a alegria dos esposos e convidados pudesse
continuar.
O
acontecimento de Cana tem sentido emblemático, simbólico. O vinho
representa o amor entre o esposo e a esposa. A falta de vinho seria
decepcionante. Poderia ser interpretada como falta de amor entre os dois jovens.
Que lição podemos tirar desse
episódio?
-
O ocorrido em Cana, o imprevisto, pode acontecer
em qualquer matrimônio;
-
O casal começa sua vida matrimonial
entusiasmado, feliz. Nada mais existe no mundo a não ser os dois;
-
De repente, algo de errado começa a pintar;
-
O vinho, o símbolo da alegria e do amor
recíproco começa a faltar;
-
O clima de felicidade, o céu, com o passar dos dias e dos
anos vão desaparecendo, em meio a nuvens sombrias e angustiantes.
Todo sentimento humano, justamente porque ser humano, tende a
exaurir-se, a desaparecer com o tempo. A repetição, o hábito, a falta de
novidade podem trazer a frieza, o tédio e acabarem com o amor conjugal. “ O hábito é um monstro que desce sobre a família
como uma nuvem de tristeza e
angustia” (Shakespeare).
Nestas condições, acabou-se o vinho e o casal não tem mais nada a
oferecer àqueles que foram convidados para as bodas: os filhos. Eles só
observam em seus genitores a canseira, a frieza recíproca e até mesmo uma
amarga desilusão.
Como esta situação poderia ser consertada?
Este sofrimento, este calvário desapareceriam se o casal convidasse os
personagens presentes nas bodas de Caná: Jesus e sua Mãe. Eles poderiam trazer
um novo vinho, quando o
entusiasmo, a atração física, as novidades, o amor dos primeiros meses ou anos de
noivado começassem a desaquecer. Ofereceriam um vinho melhor que o primeiro. Um
novo amor conjugal menos efervescente e fogoso que o juvenil, por vezes quase
irracional. Porém um amor mais profundo e duradouro, mais compreensivo, solidário e capaz do perdão mútuo e
constante. Um amor que permanecendo conjugal torna-se tb evangélico, mais cristão,
voltado para o próximo.
Que significa convidar Jesus para o
matrimônio?
A primeira coisa é reconhecer que o casamento não é simplesmente um acontecimento privado entre um homem e uma
mulher.
Em segundo lugar
deve-se aceitar o casamento como uma
vocação, um chamado divino para realizar na terra o próprio destino.
Finalmente
reconhecer que esta vocação, este chamado vem de Deus que dá ao casal as forças
necessárias para realizar sua missão.
Matrimônio: Sacramento e Carisma
O matrimônio é
um Sacramento, mas é tb um Carisma, isto é: um dom, um talento
para desempenho de uma missão. Neste sentido o matrimônio deve ser vivido em ótica escatológica, isto é, com um
olhar voltado para o futuro.
São Paulo nos
lembra que o tempo é breve. Ele se refere ao tempo concedido por Deus aos
homens para que eles trabalhem, preparem sua salvação, através da fé.
Uma dimensão essencial do viver humano e cristão é por conseguinte a transitoriedade,
o caráter provisório de nossa existência terena. Somos peregrinos, romeiros,
forasteiros nesta terra. Cidadãos caminhando para um outro mundo, aspirantes de
uma nova pátria.
A palavra paróquia originalmente significa peregrinação. Vivemos como
os hebreus quando deixaram o Egito. A Carta aos Hebreus nos lembra que não temos aqui embaixo uma cidade estável,
mas procuramos aquela futura (Heb. 13,14). É portando nesta perspectiva carismática,
escatológica, nesta ótica de futuro, que o matrimônio deve ser vivido. Deste
modo, o sacramento terá outro significado, sua existência será uma doação de um
para com o outro.
Diariamente o esposo perguntará a si mesmo: será que há alguma coisa que deveria ter feito por minha esposa e não o
fiz. Enquanto que ela fará para si, idêntica interrogação. Neste clima, não
obstante as dificuldades, viverão na alegria, seguindo o preceito evangélico do
é melhor dar que receber.
Não se pode esquecer que na vivência matrimonial a força para cumpri-la
vem do mesmo Doador do carisma que é o E. Santo. Ele é a Luz, a Força, o Vinho
Novo dos esposos cristãos. Ele é o Amor Eterno que sabe ensinar a amar e a
doar-se no amor.
É ele que une os casais desanimados, decepcionados com o próprio
matrimônio, desapaixonados e aborrecidos que vivem por anos o terrível divórcio do coração. Lembremos que Deus
é amor e é fiel. Ele pode fazer voltar o clima, o encanto dos primeiros tempos,
aquela graça que fazia dos dois uma só carne, um só espírito.
A Eucaristia é o Sacramento do Amor, da União, da eterna Aliança. Que a
sua força ajude a todos os esposos cristãos a renovarem aquela aliança
de amor que um dia selaram diante do altar. E assim, possam caminhar inseparáveis,
na alegria e na felicidade dos primeiros tempos ajudando-se e amando-se
mutuamente até alcançarem a Fonte do Amor Eterno.
ASSIM
SEJA.
Nunca tinha analisado a passagem bíblica na perspectiva apresentada. Gostei demais do texto. Tenho certeza que muitos casais que vivem divorciados do coração, serão tocados com a mensagem. Parabéns!!! Quisera está na assembléia e assistir a pregação ao vivo!
ResponderExcluirEsse comentário está muito bacana. Também, nunca tinha escutado uma homilia com essa interpretação do texto bíblico que trata do casamento de Caná. Hoje precisa mesmo que seja tocado o coração dos casais, pois o divorcio de coração (esse termo é muito apropriado a atualidade)está aumentando muito. Necessário que se faça uma reflexão urgente e os façam pensar no compromisso da família que assumiram perante Deus.
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