Tema do 2º Domingo da Quaresma
As leituras deste domingo convidam-nos
a reflectir sobre a nossa “transfiguração”, a nossa conversão à vida nova de
Deus; nesse sentido, são-nos apresentadas algumas pistas.
A primeira leitura
apresenta-nos Abraão, o modelo do crente. Com Abraão, somos convidados a
“acreditar”, isto é, a uma atitude de confiança total, de aceitação radical,
de entrega plena aos desígnios desse Deus que não falha e é sempre fiel às
promessas.
A segunda leitura convida-nos a renunciar a essa atitude de
orgulho, de auto-suficiência e de triunfalismo, resultantes do cumprimento de
ritos externos; a nossa transfiguração resulta de uma verdadeira conversão do
coração, construída dia a dia sob o signo da cruz, isto é, do amor e da
entrega da vida.
O Evangelho apresenta-nos Jesus, o Filho amado do Pai, cujo
êxodo (a morte na cruz) concretiza a nossa libertação. O projecto libertador
de Deus em Jesus não se realiza através de esquemas de poder e de triunfo,
mas através da entrega da vida e do amor que se dá até à morte. É esse o
caminho que nos conduz, a nós também, à transfiguração em Homens Novos.
LEITURA I – Gen 15,5-12.17-18
Leitura do Livro do Génesis
Naqueles dias,
Deus levou Abrão para
fora de casa e disse-lhe:
«Olha para o céu e conta as estrelas, se as puderes
contar».
E acrescentou:
«Assim será a tua descendência».
Abrão acreditou no
Senhor,
o que lhe foi atribuído em conta de justiça.
Disse-lhe Deus:
«Eu sou
o Senhor
que te mandou sair de Ur dos caldeus,
para te dar a posse desta
terra».
Abrão perguntou:
«Senhor, meu Deus,
como saberei que a vou possuir?»
O
Senhor respondeu-lhe:
«Toma uma vitela de três anos,
uma cabra de três anos e
um carneiro de três anos,
uma rola e um pombinho».
Abrão foi buscar todos
esses animais,
cortou-os ao meio
e pôs cada metade em frente da outra metade;
mas
não cortou as aves.
Os abutres desceram sobre os cadáveres,
mas Abrão pô-los
em fuga.
Ao pôr do sol,
apoderou-se de Abrão um sono profundo,
enquanto o
assaltava um grande e escuro terror.
Quando o sol desapareceu e caíram as
trevas,
um brasido fumegante e um archote de fogo
passaram entre os animais
cortados.
Nesse dia, o Senhor estabeleceu com Abrão uma aliança,
dizendo:
«Aos
teus descendentes darei esta terra,
desde o rio do Egipto até ao grande rio
Eufrates».
AMBIENTE
A primeira leitura de hoje faz parte
das chamadas “tradições patriarcais” (Gn 12-36). São “tradições” que misturam
“mitos de origem” (descreviam a “tomada de posse” de um lugar pelo patriarca
do clã), “lendas cultuais” (narravam como um deus tinha aparecido nesse lugar
ao patriarca do clã), indicações mais ou menos concretas sobre a vida dos
clãs nómadas que circularam pela Palestina e reflexões teológicas posteriores
destinadas a apresentar aos crentes israelitas modelos de vida e de fé.
Os
clãs referenciados nas “tradições patriarcais” – nomeadamente os de Abraão,
Isaac e Jacob – tinham os seus sonhos e esperanças. O denominador comum
desses sonhos era a esperança de encontrar uma terra fértil e bem irrigada,
bem como possuir uma família forte e numerosa que perpetuasse a “memória” da
tribo e se impusesse aos inimigos. O deus aceite pelo grupo era o potencial
concretizador desse ideal.
É neste “ambiente” que este texto nos coloca.
Diante de Deus, Abraão lamenta-se (cf. Gn 15,2-3) porque a sua vida está a
chegar ao fim e o seu herdeiro será um servo – Eliezer (conhecemos contratos
do séc. XV a. C. onde se estipula, em caso de falta de filhos, a adopção de
escravos que, por sua vez, se comprometiam a dar ao seu senhor uma sepultura
conveniente. Parece ser a esse costume que o texto alude). Qual será a
resposta de Deus ao lamento de Abraão?
MENSAGEM
A primeira parte deste texto começa
com Deus a responder a Abraão e a garantir-lhe uma descendência numerosa
“como as estrelas do céu” (vers. 5). Na sequência, o narrador deixa Abraão a
contemplar em silêncio o céu estrelado e volta-se para o leitor,
comunicando-lhe os seus próprios juízos teológicos (vers. 6): Abraão
acreditou em Jahwéh e, por isso, o Senhor considerou-o como justo. A fé
(usa-se o verbo “’aman”, que significa “estar firme”, “ser leal”, “acreditar
plenamente”) de que aqui se fala traduz uma atitude de confiança total, de
aceitação radical, de entrega plena aos desígnios de Deus; a justiça é um conceito
relacional, que exprime um comportamento correcto no que diz respeito a uma
relação comunitária existente: aqui, significa o reconhecimento de que Abraão
teve um comportamento correcto na sua relação com Jahwéh, ao confiar
totalmente em Deus e ao aceitar os seus planos sem qualquer dúvida ou
discussão.
Há ainda o complemento habitual da promessa: a garantia de uma
terra (vers. 7). Os dois temas – descendência e posse da terra – andam
associados, nestes casos.
A segunda parte do texto apresenta Deus a fazer os
preparativos de um misterioso cerimonial. Trata-se de um rito de conclusão de
uma aliança, conhecido sob esta ou outra forma semelhante em numerosos povos
antigos: cortavam-se os animais em dois e colocavam-se as duas metades frente
a frente; quem subscrevia a aliança passava entre as duas metades de animais
e pronunciava contra si próprio uma espécie de maldição, para o caso de ser
responsável pela quebra do pacto.
Seguindo o modo como entre os homens se
garantia a máxima firmeza contratual, o catequista bíblico acentua a ideia de
um compromisso solene e irrevogável que Deus assume com Abraão. A promessa de
Deus fica assim totalmente garantida.
Repare-se, ainda, num outro pormenor:
Deus não exigiu nada a Abraão, em troca, nem Abraão teve que passar no meio
dos animais mortos (só Deus passou, no “fogo ardente”). A promessa de Deus a
Abraão é, pois, totalmente gratuita e incondicional.
ACTUALIZAÇÃO
Considerar, para reflexão, os
seguintes elementos:
• Apesar da contínua reafirmação das
promessas, Abraão está velho, sem filhos, sem a terra sonhada e a sua vida
parece condenada ao fracasso. Seria natural que Abraão manifestasse o seu
desapontamento e a sua frustração diante de Deus; no entanto, a resposta de
Abraão é confiar totalmente em Deus, aceitar os seus projectos e pôr-se ao
serviço dos desígnios de Jahwéh. É esta mesma confiança total que marca a
minha relação com Deus? Estou sempre disposto – mesmo em situações que eu não
compreendo – a entregar-me nas mãos de Deus e a confiar nos seus desígnios?
• O Deus que se revela a Abraão é um
Deus que se compromete com o homem e cujas promessas são garantidas,
gratuitas e incondicionais. Diante disto, somos convidados a construir a
nossa existência com serenidade e confiança, sabendo que no meio das tempestades
que agitam a nossa vida Ele está lá, acompanhando-nos, amando-nos e sendo a
rocha segura a que nos podemos agarrar quando tudo o resto falhou.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 26 (27)
Refrão: O Senhor é a minha luz e a
minha salvação.
O Senhor é minha luz e salvação:
a
quem hei-de temer?
O Senhor é protector da minha vida:
de quem hei-de ter
medo?
Ouvi, Senhor, a voz da minha súplica,
tende
compaixão de mim e atendei-me.
Diz-me o coração: «Procurai a sua face».
A
vossa face, Senhor, eu procuro.
Não escondais de mim o vosso rosto,
nem
afasteis com ira o vosso servo.
Não me rejeiteis nem abandoneis,
meu Deus e
meu Salvador.
Espero vir a contemplar a bondade do
Senhor
na terra dos vivos.
Confia no Senhor, sê forte.
Tem coragem e confia
no Senhor.
LEITURA II – Filip 3,17-4,1
Leitura da Epístola do apóstolo São
Paulo aos Filipenses
Irmãos:
Sede meus imitadores
e ponde
os olhos naqueles
que procedem segundo o modelo que tendes em nós.
Porque há
muitos,
de quem tenho falado várias vezes
e agora falo a chorar,
que procedem
como inimigos da cruz de Cristo.
O fim deles é a perdição:
têm por deus o
ventre,
orgulham-se da sua vergonha
e só apreciam as coisas terrenas.
Mas a
nossa pátria está nos Céus,
donde esperamos, como Salvador, o Senhor Jesus
Cristo,
que transformará o nosso corpo miserável,
para o tornar semelhante ao
seu corpo glorioso,
pelo poder que Ele tem
de sujeitar a Si todo o universo.
Portanto,
meus amados e queridos irmãos,
minha alegria e minha coroa,
permanecei firmes
no Senhor.
AMBIENTE
Na prisão (em Éfeso?), Paulo agradece
aos Filipenses a preocupação manifestada (eles até enviaram dinheiro e um
membro da comunidade para ajudar Paulo no cativeiro), dá notícias, exorta-os
à fidelidade e põe-nos de sobreaviso em relação aos falsos pregadores do Evangelho
de Jesus. Estamos no ano 56/57, provavelmente.
O texto que nos é proposto
como segunda leitura faz parte de um longo desenvolvimento (cf. Flp 3,1-4,1),
no qual Paulo avisa os Filipenses para que tenham cuidado com “os cães”, os
“maus obreiros”, os “falsos circuncidados” (cf. Flp 3,2). Quem são estes, a
quem Paulo se refere de uma forma tão pouco delicada? Muito provavelmente,
são esses cristãos de origem judaica (“judaizantes”) que se consideravam os
únicos perfeitos e detentores da verdade, que exigiam aos cristãos o
cumprimento da Lei de Moisés e que, dessa forma, lançavam a confusão nas
comunidades cristãs do mundo helénico. As duras palavras de Paulo resultam da
sua revolta diante daqueles que, com a sua intolerância, com o seu orgulho e
auto-suficiência, confundiam os cristãos e punham em causa o essencial da fé
(o Evangelho não é o cumprimento de ritos externos, mas a adesão à proposta
gratuita de salvação que Deus nos faz em Jesus).
MENSAGEM
Os Filipenses têm diante de si dois
possíveis e muito diferentes exemplos a seguir. Um é o de Paulo, que se
considera um atleta de fundo, que já começou a sua corrida, mas tem
consciência de que ainda não atingiu a meta; outro é o desses pregadores
“judaizantes” que alardeiam participar já, de forma plena e definitiva, no
triunfo de Cristo. Paulo recusa este triunfalismo e não duvida em pedir aos
Filipenses que não imitem o exemplo de orgulho desses pregadores, mas o
exemplo do próprio Paulo. Aos Filipenses e a todos os cristãos, Paulo avisa
que em nenhum caso devem considerar-se como atletas já vitoriosos e coroados
de glória, mas como atletas em plena competição, esperando alcançar a meta e
a vitória. A salvação não está consumada; encontra-se ainda em processo de
gestação. É um processo em que o cristão vai amadurecendo progressivamente,
sob o signo da cruz de Cristo.
Quanto a esses, “cujo deus é o ventre” (Paulo
visa aqui, com alguma ironia, as observâncias alimentares dos “judaizantes”),
que põem o “orgulho na sua vergonha” (sem dúvida, a circuncisão, sinal da
pertença ao “povo eleito”) e “colocam o seu coração nas coisas terrenas”
(alguns pensam que Paulo se refere, aqui, a certas práticas libertinas),
esses esqueceram o essencial e estão condenados à perdição (vers. 19).
O
nosso destino definitivo, segundo Paulo, não é um corpo corruptível e mortal,
mas um corpo transfigurado pela ressurreição. Como garantia de que será
assim, temos Jesus Cristo, Senhor e Salvador.
ACTUALIZAÇÃO
Na reflexão deste texto, ter em conta
as seguintes linhas:
• Neste tempo de transformação e
renovação, somos convidados pela Palavra de Deus a ter consciência de que a
nossa caminhada em direcção ao Homem Novo não está concluída; trata-se de um
processo construído dia a dia sob o signo da cruz, isto é, numa entrega total
por amor que subverte os nossos esquemas egoístas e comodistas.
• Considerar-se (como os “judaizantes”
de que Paulo fala) como alguém que já atingiu a meta da perfeição pela
prática de alguns ritos externos (as normas alimentares e a circuncisão, para
os “judaizantes”, ou as práticas de jejum e abstinência, para os cristãos) é
orgulho e auto-suficiência: significa que ainda não percebemos onde está o
essencial – na mudança do coração. Só a transformação radical do coração nos
conduzirá a essa vida nova, transfigurada pela ressurreição.
ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO
Refrão 1: Louvor e glória a Vós, Jesus
Cristo Senhor.
Refrão 2: Glória a Vós, Jesus Cristo, Sabedoria do Pai.
Refrão
3: Glória a Vós, Jesus Cristo, Palavra do Pai.
Refrão 4: Glória a Vós,
Senhor, Filho do Deus vivo.
Refrão 4: Louvor a Vós, Jesus Cristo, rei da
eterna glória.
Refrão 6: Grandes e admiráveis são as vossas obras, Senhor.
Refrão
7: A salvação, a glória e o poder a Jesus Cristo, Nosso Senhor.
No meio da nuvem luminosa, ouviu-se a
voz do Pai:
«Este é o meu Filho muito amado: escutai-O».
EVANGELHO – Lc 9,28b-36
Evangelho de Nosso senhor Jesus Cristo
segundo São Lucas
Naquele tempo,
Jesus tomou consigo
Pedro, João e Tiago
e subiu ao monte, para orar.
Enquanto orava,
alterou-se o
aspecto do seu rosto
e as suas vestes ficaram de uma brancura refulgente.
Dois
homens falavam com Ele:
eram Moisés e Elias,
que, tendo aparecido em glória,
falavam
da morte de Jesus,
que ia consumar-se em Jerusalém.
Pedro e os companheiros
estavam a cair de sono;
mas, despertando, viram a glória de Jesus
e os dois
homens que estavam com Ele.
Quando estes se iam afastando,
Pedro disse a
Jesus:
«Mestre, como é bom estarmos aqui!
Façamos três tendas:
uma para Ti,
outra para Moisés e outra para Elias».
Não sabia o que estava a dizer.
Enquanto
assim falava,
veio uma nuvem que os cobriu com a sua sombra;
e eles ficaram
cheios de medo, ao entrarem na nuvem.
Da nuvem saiu uma voz, que dizia:
«Este
é o meu Filho, o meu Eleito: escutai-O».
Quando a voz se fez ouvir, Jesus
ficou sozinho.
Os discípulos guardaram silêncio
e, naqueles dias, a ninguém
contaram nada do que tinham visto.
AMBIENTE
Estamos no final da “etapa da
Galileia”; durante essa etapa, Jesus anunciou a salvação aos pobres,
proclamou a libertação aos cativos, fez os cegos recobrar a vista, mandou em
liberdade os oprimidos, proclamou o tempo da graça do Senhor (cf. Lc
4,16-30). À volta de Jesus já se formou esse grupo dos que acolheram a oferta
da salvação (os discípulos). Testemunhas das palavras e dos gestos
libertadores de Jesus, eles já descobriram que Jesus é o Messias de Deus (cf.
Lc 9,18-20). Também já ouviram dizer que o messianismo de Jesus passa pela
cruz (cf. Lc 9,21-22) e que os discípulos de Jesus devem seguir o mesmo
caminho de amor e de entrega da vida (cf. Lc 9,23-26); mas, antes de subirem
a Jerusalém para testemunhar a erupção total da salvação, recebem a revelação
do Pai que, no alto de um monte, atesta que Jesus é o Filho bem amado. Os
acontecimentos que se aproximam ganham, assim, novo sentido.
Para o homem bíblico,
o “monte” era o lugar sagrado por excelência: a meio caminho entre a terra e
o céu, era o lugar ideal para o encontro do homem com o mundo divino. É,
portanto, no monte que Deus Se revela ao homem e lhe apresenta os seus
projectos.
MENSAGEM
O relato da transfiguração de Jesus,
mais do que uma crónica fotográfica de acontecimentos, é uma página de
teologia; aí, apresenta-se uma catequese sobre Jesus, o Filho amado de Deus,
que através da cruz concretiza um projecto de vida.
O episódio está cheio de
referências ao Antigo Testamento. O “monte” situa-nos num contexto de
revelação (é “no monte” que Deus Se revela e que faz aliança com o seu Povo);
a “mudança” do rosto e as vestes de brancura resplandecente recordam o
resplendor de Moisés, ao descer do Sinai (cf. Ex 34,29); a nuvem indica a
presença de Deus conduzindo o seu Povo através do deserto (cf. Ex 40,35; Nm
9,18.22;10,34).
Moisés e Elias representam a Lei e os Profetas (que anunciam
Jesus e que permitem entender Jesus); além disso, são personagens que, de
acordo com a catequese judaica, deviam aparecer no “dia do Senhor”, quando se
manifestasse a salvação definitiva (cf. Dt 18,15-18; Mal 3,22-23). Eles falam
com Jesus sobre a sua “morte” (“exodon” – “partida”) que ia dar-se em
Jerusalém. A palavra usada por Lucas situa-nos no contexto do “êxodo”: a
morte próxima de Jesus é, pois, vista por Lucas como uma morte libertadora,
que trará o Povo de Deus da terra da escravidão para a terra da liberdade.
A
mensagem fundamental é, portanto, esta: Jesus é o Filho amado de Deus,
através de quem o Pai oferece aos homens uma proposta de aliança e de
libertação. O Antigo Testamento (Lei e Profetas) e as figuras de Moisés e
Elias apontam para Jesus e anunciam a salvação definitiva que, n’Ele, irá
acontecer. Essa libertação definitiva dar-se-á na cruz, quando Jesus cumprir
integralmente o seu destino de entrega, de dom, de amor total. É esse o “novo
êxodo”, o dia da libertação definitiva do Povo de Deus.
E o “sono” dos
discípulos e as “tendas”? O “sono” é simbólico: os discípulos “dormem” porque
não querem entender que a “glória” do Messias tenha de passar pela
experiência da cruz e da entrega da vida; a construção das “tendas” (alusão à
“festa das tendas”, em que se celebrava o tempo do êxodo, quando o Povo de
Deus habitou em “tendas, no deserto?) parece significar que os discípulos
queriam deter-se nesse momento de revelação gloriosa, de festa, ignorando o
destino de sofrimento de Jesus.
ACTUALIZAÇÃO
Reflectir a partir das seguintes
linhas:
• O facto fundamental deste episódio
reside na revelação de Jesus como o Filho amado de Deus, que vai concretizar
o plano salvador e libertador do Pai em favor dos homens através do dom da
vida, da entrega total de Si próprio por amor. É dessa forma que se realiza a
nossa passagem da escravidão do egoísmo para a liberdade do amor. A
“transfiguração” anuncia a vida nova que daí nasce, a ressurreição.
• Os três discípulos que partilham a
experiência da transfiguração recusam-se a aceitar que o triunfo do projecto
libertador do Pai passe pelo sofrimento e pela cruz. Eles só concebem um Deus
que Se manifesta no poder, nas honras, nos triunfos; e não entendem um Deus
que Se manifesta no serviço, no amor que se dá. Qual é o caminho da Igreja de
Jesus (e de cada um de nós, em particular): um caminho de busca de honras, de
busca de influências, de promiscuidade com o poder, ou um caminho de serviço
aos mais pobres, de luta pela justiça e pela verdade, de amor que se faz dom?
É no amor e no dom da vida que buscamos a vida nova aqui anunciada?
• Os discípulos, testemunhas da
transfiguração, parecem também não ter muita vontade de “descer à terra” e
enfrentar o mundo e os problemas dos homens. Representam todos aqueles que
vivem de olhos postos no céu, mas alheados da realidade concreta do mundo, sem
vontade de intervir para o renovar e transformar. No entanto, a experiência
de Jesus obriga a continuar a obra que Ele começou e a “regressar ao mundo”
para fazer da vida um dom e uma entrega aos homens nossos irmãos. A religião
não é um “ópio” que nos adormece, mas um compromisso com Deus que Se faz
compromisso de amor com o mundo e com os homens.
ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 2º
DOMINGO DA QUARESMA
(adaptadas de “Signes d’aujourd’hui”)
1. A PALAVRA MEDITADA AO LONGO DA
SEMANA.
Ao longo dos dias da semana anterior ao 2º Domingo da Quaresma,
procurar meditar a Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma
leitura em cada dia, por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação
comunitária da Palavra: num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo
de movimentos eclesiais, numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a
semana para viver em pleno a Palavra de Deus.
2. ARRANJAR UM TEMPO DE CONTEMPLAÇÃO.
Ao
longo da celebração, arranjar um verdadeiro tempo de contemplação silenciosa
(seja depois da homilia, seja depois da comunhão), um tempo que será
introduzido de maneira a ser um “coração a coração” com Cristo transfigurado,
“que transformará o nosso corpo miserável, para o tornar semelhante ao seu
corpo glorioso” (segunda leitura).
3. ORAÇÃO NA LECTIO DIVINA.
Na
meditação da Palavra de Deus (lectio divina), pode-se prolongar o acolhimento
das leituras com a oração.
No final da primeira leitura:
“Deus de
Abraão, Deus de nossos pais na fé, nós Te reconhecemos como o Pai do Povo
inumerável dos crentes, que Tu multiplicaste como as estrelas do céu e a
areia do deserto. Nós Te bendizemos.
Nós Te pedimos por todos os crentes que
se reconhecem filhos de Abraão em diferentes confissões. Que o teu Espírito
nos guie para a unidade”.
No final da segunda leitura:
“Pai, nós
Te damos graças, porque nos nomeaste cidadãos dos céus e nos deste os modelos
de Jesus e dos Apóstolos para nos guiar.
Que o teu Espírito, pelo seu poder,
transforme os nossos pobres corpos à imagem do corpo glorioso de teu Filho,
que esperamos como Salvador. Confirma a nossa esperança”.
No final do Evangelho:
“Deus de luz,
bendito sejas por estes momentos de oração em cada domingo. Tu nos
transportas sobre a montanha, com Jesus e os discípulos. É bom estarmos aqui,
na tua presença.
Nós Te pedimos: abre o coração e o espírito de todos os
fiéis cristãos à Palavra viva do teu Filho bem-amado, para que o escutemos”.
4. BILHETE DE EVANGELHO.
Quando Jesus
está em oração, não está só, Deus seu Pai está com Ele. O monte é o lugar da
revelação de Deus e a nuvem é símbolo da sua presença. É, pois, no momento em
que Jesus rezava que Deus Se manifesta, não somente a seu Filho, mas também
aos seus discípulos, e a presença de Moisés e de Elias recorda a antiga
aliança àqueles que vão beneficiar da nova aliança. Ao mesmo tempo que, no
monte Sinai, Deus tinha revelado o seu Nome a Moisés para fazer sair do
Egipto o seu povo escolhido, também na montanha da Transfiguração Deus dá a
identidade de Jesus: “Este é o meu Filho, o meu Eleito”. E aos três
apóstolos, embaixadores de todos aqueles que reconhecerão em Jesus o Filho
bem-amado, Deus pede para O escutar. É antes de ver a nuvem e de ouvir a voz
do Pai que Pedro propõe para erguer três tendas para Jesus, Moisés e Elias,
porque pensa que são apenas três. Será necessário que Deus Se manifeste para
que Pedro, um pouco como Jacob, diga talvez: “Deus estava no monte e eu não
sabia!” Será preciso chegar à manhã de Páscoa, e o dom do Espírito no
Pentecostes, para que ele proclame a sua fé n’Aquele que Deus fez “Senhor e
Messias, este Jesus que crucificaram”.
5. À ESCUTA DA PALAVRA.
“Este é o meu
Filho, o meu Eleito: escutai-O”. A voz vinda da nuvem pede-nos para escutar
Jesus. Prestar atenção ao que o outro diz… Isso nem sempre é fácil, é
necessário estar interiormente disponível ao outro, fazer um tempo de paragem
interior, um tempo de silêncio para poder dar ao outro espaço para que se
possa exprimir. É preciso acolher o que o outro quer dizer-nos, sem quaisquer
preconceitos ou filtros… Todo o diálogo verdadeiro implica tal escuta, exige
uma lenta e paciente aprendizagem do silêncio exterior, mas sobretudo, o que
é ainda mais difícil, do silêncio interior. Hoje, trata-se se escutar o Filho
que Deus escolheu. Ora, Jesus nada diz aos três discípulos. Entretém-se com
Moisés e Elias, que simbolizam a Lei e os Profetas, isto é, toda a Escritura,
toda a Palavra que Deus dirigiu ao seu Povo. A sua única presença torna-se,
de facto, uma palavra em acto. Eles manifestam que toda a Revelação tem o seu
cumprimento em Jesus. É preciso, pois, “escutar o Filho” porque n’Ele
encontramos tudo o que Jesus quer dizer-nos, hoje. Não precisamos de procurar
novas luzes noutros lugares, nas visões ou revelações de várias espécies…
Tudo nos é dado em Jesus. Eis porque colocarmo-nos na escuta da Palavra que é
Jesus é de uma importância capital, se queremos ser verdadeiramente
discípulos de Cristo. É uma das grandes graças do Concílio Vaticano II haver
dado todo o seu lugar à Palavra de Deus, na liturgia e na vida dos cristãos,
uma Palavra a receber pessoalmente e a escutar em Igreja. O tempo da Quaresma
é-nos oferecido, precisamente, como uma ocasião para nos colocarmos mais na
escuta da Palavra de Deus que Se fez carne. Oxalá possamos aproveitar para
aprofundar o nosso silêncio interior, tornando-nos mais atentos ao que Jesus
nos quer dizer, a cada um e a cada uma de entre nós e à nossa comunidade.
6. ORAÇÃO EUCARÍSTICA.
A Oração
Eucarística III adapta-se bem à liturgia deste domingo.
7. PALAVRA PARA O CAMINHO…
«Este é o
meu Filho, o meu Eleito: escutai-O»… O catecismo de muitos de entre nós está
bem distante, a nossa bagagem religiosa talvez esteja leve: eis a Quaresma, a
ocasião para recuperar energias. Como? Trata-se de ir às fontes, às raízes,
aos fundamentos! Esta fonte é Jesus Cristo. “Escutai-O”, diz a voz que se faz
ouvir das nuvens: vinde beber a sua Palavra! Abrimos o Livro onde corre esta
fonte de água viva? Será que ao lermos os Evangelhos – este ano o Evangelho
de Lucas – abrimos os ouvidos e deixamo-nos pôr em questão pelo Mestre?
UNIDOS PELA PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA
PARA
ESCUTAR, PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES
DEHONIANAS
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José
Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus
(Dehonianos)
Rua Cidade de Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel.
218540900 – Fax: 218540909
portugal@dehonianos.org – www.dehonianos.org
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